Piras de fumo empilhadas sobre as chaminés
Testemunham a morte dos meus irmãos
Têm a forma de um símbolo sagrado
Profanado nas aras da candura
Ecos de dor passeiam ainda pelos escombros
Procurando pelo seu corpo apanhado na surpresa do fim
Um silêncio amarfanhado corta o ar
E corrói o selo da natureza ultrajada
Escorrem das nuvens cordas de pétalas tristes
Há uma lâmina que risca sulcos nos nós do tempo
Piras de fumo empilhadas sobre as chaminés
Testemunham a morte dos meus irmãos
Choro os irmãos descidos ao infra-humano
A vítima e o algoz no mesma espiral de fezes
Que abismos de agonia que fragas de cerração
Terão trocado esses olhares quando se cruzaram?
Olhos fundos dedos descarnados um esgar de volúpia
Ante a quimera dum dia sem luz
O horizonte fica coberto de vultos empunhando pás
Talvez felizes talvez expectantes da terra húmida
Não consigo vislumbrar a fímbria do dia
Não consigo olhar o espelho
Não consigo olhar
Não consigo
Não
Ah, a crua náusea de não poder dizer nunca mais!
Mito, 27-01-2005
1 comentário:
Gostava de descobrir como conseguiste escrever este poema a preto e branco, a fazerlembrar os registos fílmicos da época, ou como conseguiste retratar os mortos (mesmo os que sobreviveram...). E as piras de fumo são uma excelente imagem, tal como a náusea que inspiram - ou deviam inspirar.Sempre.
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