quinta-feira, agosto 17, 2006


É certo que, apesar de nunca estar só a maior parte do tempo, o homem vive e morre sozinho consigo mesmo. A solidão pode ser uma dor funda quando se é um animal gregário. Cada qual se revê nos seus pares, quer por identificação, quer por oposição, quer ainda – e sobretudo – pela interacção. Mesmo os que optam pelo isolamento o fazem com a consciência de estarem a quebrar a ordem natural.

Numa recente visita ao Zoo da Maia, chocou-me particularmente a situação do único orangotango existente: imóvel, contemplativo, parado na sua tristeza. O enorme primata permanece sentado, de frente para os visitantes, encostado ao espesso vidro, já não com qualquer tom acusatório no olhar, mas como uma efígie ao desalento. Por vezes, estica o braço e consegue colocar a gigantesca mão por cima do vidro, no pequeno espaço aberto. E lá no alto, em contraste com o vidro embaciado, paira essa mão como uma garrafa lançada ao mar. Essa mão que nos une.

1 comentário:

Graça disse...

É muito bonito este texto. É lamentável que se mantenham os animais assim em cativeiro. Não sei o que me faz mais pena: se a solidão, se o confinamento. Talvez o último fosse tolerável se partilhado.