sexta-feira, dezembro 09, 2005

O referido guichet


Fui hoje ao CAE de Aveiro. Coordenação Educativa de Aveiro. Foi muito educativo.

Fiquei chocado. Não entrava em instalações tão paupérrimas e decadentes, desde que tinha ido renovar o passe de estudante a uma empresa de camionagem que funcionava num vetusto edifício que, de resto, já abandonou há muito. Já passaram mais de 20 anos.

Voltemos a 2005. Depois de subir um lance de escadas escuro e bafiento, desembocamos numa saleta de espera com um mobiliário espartano e degradado, onde pousam folhetos desalinhados e decerto obsoletos, ali esquecidos desde tempos imemoriais. Há um guichet com aquelas janelinhas de vidro martelado com uma seca frincha entreaberta, como que a pedir a todos os santos para não ser importunada. A altura do referido guichet obriga qualquer pessoa de origem não pigmeia a curvar-se acentuadamente para espreitar quem poderá vir a atendê-lo daquele buraco. A qualquer momento esperamos ver assomar o bicharoco da “Metamorfose” de Kafka. Entre o referido guichet – perdoem-me o galicismo em pleno período de gripe das aves – e o público, está uma anosa secretária metálica com o tampo traseiro virado para a frente, parecendo ter como única função evitar que alguém se aproxime do referido guichet e tornar ainda mais desagradável qualquer abordagem.
Não tive coragem de interromper o tranquilo remanso do vulto que se suspeitava por trás do referido guichet e por ali fiquei expectante. Por sorte, um outro habitante do covil que saía para um cafezinho atendeu-me solicitamente.

Se é para manter serviços do Estado nestas condições indignas, mais valera que o “referido” Estado as encerrasse.

2 comentários:

Graça disse...

A realidade é sombria, mas o texto é hilariante, ou não tivesse o tempero queirosiano que costumas pôr nestes pratos. O que vale é que se pode repetir.

Mito disse...

A amabilidade da Graça só é superada pela sua benevolência. Continua a afagar o meu eguito...